Torcedores
Jogos
entre os seis grandes (Bangu e América também eram) levavam 50, 70, 140 mil
torcedores ao estádio. Ainda que não oficialmente, apenas por tradição, as
torcidas do Vasco da Gama e Flamengo tinham seus lugars cativos nas
arquibancadas: os cruzmaltinos, o lado direito das cabines de rádio, e os rubro-negros,
o esquerdo. Os torcedores iam ocupando seu espaço até se misturarem pacificamente
nas arquibancadas do lado oposto às cabines de rádio. Nenhuma
restrição a fogos de artifício ou foguetes, acionados assim que os times
entravam em campo ou quando da marcação de um gol. A que mais usava esse tipo de
manifestação sempre foi a do Botafogo, entretanto nunca se soube de acidente
grave por fogos de artifício ou de estampido. Cada um torcia a seu modo, embora
existissem os torcedores mais influentes, que se tornavam líderes naturais.
Líderes
ou chefes
Liderava
a torcida do Flamengo o também chefe da “charanga rubro-negra”, Jayme de
Carvalho. Charanga era um tipo de banda que animava o time e os torcedores tocando
o tempo todo o hino do clube e as marchinhas carnavalescas mais populares. Passavam
a impressão que se divertiam mais com a charanga do que com próprio jogo, pois
muitos de seus componentes permaneciam a maior parte do tempo de costas para o
gramado...
Botafogo
O
líder botafoguense era um jovem de físico avantajado, por isso apelidado Tarzan.
Só o vi envolvido em um incidente, assim mesmo sem culpa dele. Foi durante um
Botafogo e Bangu, em São Januário. Uma desavença sem muita importância com a torcida
do Bangu, que acuou a do Botafogo. Sem saída, se protegeram junto às cabines de
rádio, no alto das arquibancadas. Tarzan, num gesto de defesa, empunhou o
mastro da bandeira do alvinegro como se fora uma lança apontada para o
“inimigo”... Poucos minutos e tudo acabou em paz. Os adversários se
cumprimentavam.
América
Da
sede do América Futebol Clube na Rua Campos Sales, saía uma barulhenta bandinha
em direção ao estádio. Muito emocionante vê-la executando o hino do América, o
mais bonito do futebol brasileiro, composto em 1950 pelo ilustre americano
Lamartine Babo. A
torcida americana não tinha um líder de destaque, mas era simbolizada por um
senhor magro, meia idade, que passava diariamente pelas ruas da Tijuca
pedalando uma bicicleta enfeitada com as cores e bandeirinhas do clube
rubro.
Fluminense
A tradicional
aristocracia do Fluminense F.C. era
representada, inclusive nas charges dos jornais esportivos, pela figura de um
cavalheiro trajando elegantemente fraque, bengala, cartola e uma longa piteira.
Assim vestido, um torcedor tricolor comparecia ao estádio para incentivar a sua
grande torcida. Um “gentleman”.
Vasco
da Gama
Simbolizava
a torcida do Vasco da Gama, Ramalho, um simpático senhor de uns 40 anos de
idade, tema de inúmeras reportagens e crônicas em jornais e revistas. Vestindo roupa
branca impecável, boné e camisa do clube, Ramalho chegava ao estádio minutos
antes do início do jogo. Assim que surgia num das rampas de acesso às
arquibancadas do Maracanã, Ramalho fazia soar solenemente os famosos “clarins”
do Vasco da Gama, instrumentos feitos por ele próprio utilizando talos de
mamoeiro de sua casa, conforme contava em reportagens publicadas na época. Era
o “toque de guerra” dos cruzmaltinos, uma guerra de paz: sem armas e feridos. Corria
uma lenda contando que o Vasco não venceria o jogo se o Ramalho não chegasse
antes da bola rolar, por isso seu atraso na chegada provocava muita apreensão à
torcida vascaína, e creio que até mesmo nos jogadores e dirigentes. Não fazia isso
intencionalmente, porém era comum vê-lo surgir todo esbaforido no estádio poucos
minutos antes do apito inicial. Ajeitava seus apetrechos, consertava a faixa
cruzmaltina em diagonal no peito, e só então fazia soar pelo belo estádio o som
vibrante de seus mágicos clarins. A torcida exultava, pois a vitória estava “garantida”
pelo Ramalho e pela incrível qualidade da equipe mantida pelo clube da Colina
Histórica.
(Continua)
Foto:
Manchete Esportiva do Blog kike da bola
(28/08/2019)