O DIÁRIO DE GUERRA
(Imagem de autoria não identificada)
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Residimos dois anos e meio em Belém (PA) a serviço de uma empresa estatal. Um de nossos colegas, sr. Mourão, tinha sido jornalista do diário local Folha do Norte, além de ex-combatente na II Guerra Mundial, integrante da Força Expedicionária Brasileira (FEB), na Itália.
Falava com muito orgulho do trabalho que realizara na Copa do Mundo de 1938, taquigrafando todos os lances dos jogos do Brasil narrados pelo rádio por Gagliano Netto, considerado o pioneiro dos narradores esportivos do país. O “jogo completo” saía no dia seguinte na primeira página da Folha, cujos exemplares se esgotavam em poucos minutos.
Mourão não tinha trauma e nem neurose de guerra, pelo contrário, até gostava de falar no assunto. Eu, curioso, não perdia oportunidade de lhe fazer perguntas sobre as experiências que vivera na frente de batalha. Um dia eu quis saber dele se durante um combate armado, ele tivera oportunidade de atirar num soldado inimigo e acertar o alvo. Ele respondeu: “Atirava num grupo de soldados que se movimentavam em meio a poeira, fumaça e bombas, e assim mesmo à grande distância. Nunca tive certeza – e nem queria ter - de que abatera um soldado inimigo. Eram jovens como eu, inimigos, sim, mas muitos estavam ali sem saber o motivo real daquilo tudo”.
Um dia eu lhe perguntei se escrevera crônicas ou mesmo um diário pessoal de guerra. “Crônicas, não. Mas desde o dia da minha convocação eu comecei a escrever um diário sobre minhas experiências na guerra. Pretendia publicá-lo por partes na Folha do Norte ou mesmo num livro, quando voltasse da Itália. A guerra acabou, e voltamos ao Brasil”
E encerrou: “No regresso, num dos portos o tumulto era grande, e ao passarmos de um navio para outro uma de minhas maletas contendo objetos pessoais caiu ao mar e naufragou, e com ela também o meu diário. Eu me lembro bem que desfilamos como heróis pela Avenida Rio Branco sob os aplausos da multidão. Havia muitas lágrimas de alegria. Eu tinha dois motivos para chorar: pela alegria da volta, claro, e pela tristeza da perda do meu “Diário de Guerra”.
São histórias pessoais aparentemente simples como esta, que muitas vezes ficam gravadas em nossa lembrança para sempre.
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Residimos dois anos e meio em Belém (PA) a serviço de uma empresa estatal. Um de nossos colegas, sr. Mourão, tinha sido jornalista do diário local Folha do Norte, além de ex-combatente na II Guerra Mundial, integrante da Força Expedicionária Brasileira (FEB), na Itália.
Falava com muito orgulho do trabalho que realizara na Copa do Mundo de 1938, taquigrafando todos os lances dos jogos do Brasil narrados pelo rádio por Gagliano Netto, considerado o pioneiro dos narradores esportivos do país. O “jogo completo” saía no dia seguinte na primeira página da Folha, cujos exemplares se esgotavam em poucos minutos.
Mourão não tinha trauma e nem neurose de guerra, pelo contrário, até gostava de falar no assunto. Eu, curioso, não perdia oportunidade de lhe fazer perguntas sobre as experiências que vivera na frente de batalha. Um dia eu quis saber dele se durante um combate armado, ele tivera oportunidade de atirar num soldado inimigo e acertar o alvo. Ele respondeu: “Atirava num grupo de soldados que se movimentavam em meio a poeira, fumaça e bombas, e assim mesmo à grande distância. Nunca tive certeza – e nem queria ter - de que abatera um soldado inimigo. Eram jovens como eu, inimigos, sim, mas muitos estavam ali sem saber o motivo real daquilo tudo”.
Um dia eu lhe perguntei se escrevera crônicas ou mesmo um diário pessoal de guerra. “Crônicas, não. Mas desde o dia da minha convocação eu comecei a escrever um diário sobre minhas experiências na guerra. Pretendia publicá-lo por partes na Folha do Norte ou mesmo num livro, quando voltasse da Itália. A guerra acabou, e voltamos ao Brasil”
E encerrou: “No regresso, num dos portos o tumulto era grande, e ao passarmos de um navio para outro uma de minhas maletas contendo objetos pessoais caiu ao mar e naufragou, e com ela também o meu diário. Eu me lembro bem que desfilamos como heróis pela Avenida Rio Branco sob os aplausos da multidão. Havia muitas lágrimas de alegria. Eu tinha dois motivos para chorar: pela alegria da volta, claro, e pela tristeza da perda do meu “Diário de Guerra”.
São histórias pessoais aparentemente simples como esta, que muitas vezes ficam gravadas em nossa lembrança para sempre.
6 Comments:
As simples, são as grandes histórias.
Adelino, sendo eu de Belém, agora a nossa Belém, essa conversa muito me interessa. Talvez o Sr. Mourão tenha sido colega de Machado Coelho, meu saudoso avô, também jornalista nessa época do pós guerra. Posta mais histórias de tua passagem por Belém.
Grande abraço,
Bassalo
São simples histórias, porém história de vida.
Coisas que fazem parte de uma vida, aliás que constituem uma vida.
Um abraço
ANNA, então, veja você, parece simples dizer apenas que um diário caiu no mar e sumiu. Mas você já imaginou o sentimento solitário de frustação que o dono do diário está carregando ou carregou pelo resto da vida?
Um abraço, Anna.
Olá, EDUARDO, foi o que eu disse para a ANNA.
Obrigado pela presença.
Abraço
BASSALO, na ocasião em que lá moramos (dois anos e meio), existiam dois grande jornais: A PROVÍNCIA DO PARÁ e a FOLHA DO NORTE. Depois surgiu O LIBERAL. Atualmente não sei como está. Sobre a Folha, existia uma sirene no prédio do jornal que ecoava pela cidade anunciando notícias extrardinárias. Quando ela tocava, era só esperar. Eu me lembro dela quando do assassinato de Robert Kennedy, do AI-5 e do Homem na Lua. E tocava também quando da passagem da Procissão do Círio de Nazaré.
Qualquer hora, contarei mais sobre a "nossa" Belém no blog.
Um abraço
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