Em tempo ainda: JOÃO SALDANHA
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André Iki Siqueira, autor do livro biográfico de João Saldanha (post de 24/02/08), é de opinião que por mais que se fale e se escreva sobre o João, sempre faltará alguma coisa a ser dita. E não seríamos nós que perderíamos a oportunidade de reproduzir aqui uma linda crônica escrita por ocasião do falecimento do grande João-Sem-Medo. Um texto que expressa com perfeição o sentimento tanto da autora quanto de todos aqueles que admiravam o saudoso jornalista esportivo, independente de cor clubística ou ideologia política. Se puder, leia na íntegra, pois vale a pena.
”JOÃO SALDANHA
João, posso te chamar assim – João –, como se te conhecesse? Na verdade, sinto que te conheço. Que tenho te encontrado, vida afora, nos jornais cheios de novidades. Seu texto é uma delas, e das mais instigantes. Novidade antiga, passeou por vários lugares antes de ancorar no Jornal do Brasil.
Novidade capaz de revelar segredos como se os guardasse, e de desvendar mistérios como se os tivesse criado, enquanto fingia escrever apenas sobre futebol. Você não usava o jornal, o rádio, ou a televisão para abordar apenas um assunto. Quem sabia te ler ou te ouvir, percebia que você ensaiava vôos livres, ilimitados.
Uma vez, numa mesa-redonda de TV, enquanto um jogador estreante era elogiado por todos, você aproveitou a presença do diretor do clube e cobrou-lhe um salário justo para o gênio que despontava. Outra vez, em 1970, e isso não há quem não saiba, você deixou de ser técnico da Seleção Brasileira porque o Presidente da República quis te obrigar a realizar um vôo rasante, limitado.
Talvez ele não soubesse que você, comunista convicto, entendia de prisões e liberdades. Tanto, que saiu por aí, assoviando, à procura e ao reencontro dos companheiros. Te vi entre eles há poucos dias, comentando os jogos da Copa. Cansado, envelhecido. Não sabia que você não mais andava. Nem que tinha apenas um pulmão. Nem que afirmara ser essa sua última Copa. Uma vez mais, você sabia o que dizia.
João, brasileiramente, do seu jeito, te desejo uma eternidade verdejante. Que você escolha, entre estádios, praças, jardins e plantações, o lugar mais bonito para assoviar e reencontrar os companheiros"
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A autora é Vivina Viana, jornalista, nossa leitora, e a crônica foi publicada em 22/07/1990 na revista "Fim de Semana", do jornal "ESTADO DE MINAS", periódico para o qual ela colaborou semanalmente durante dez anos (1990-2000). Atendendo a pedido nosso, Vivina, gentilmente permitiu que a publicássemos neste humilde e despretensioso blog. Muito obrigado, Vivina. A honra foi somente nossa.
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André Iki Siqueira, autor do livro biográfico de João Saldanha (post de 24/02/08), é de opinião que por mais que se fale e se escreva sobre o João, sempre faltará alguma coisa a ser dita. E não seríamos nós que perderíamos a oportunidade de reproduzir aqui uma linda crônica escrita por ocasião do falecimento do grande João-Sem-Medo. Um texto que expressa com perfeição o sentimento tanto da autora quanto de todos aqueles que admiravam o saudoso jornalista esportivo, independente de cor clubística ou ideologia política. Se puder, leia na íntegra, pois vale a pena.
”JOÃO SALDANHA
João, posso te chamar assim – João –, como se te conhecesse? Na verdade, sinto que te conheço. Que tenho te encontrado, vida afora, nos jornais cheios de novidades. Seu texto é uma delas, e das mais instigantes. Novidade antiga, passeou por vários lugares antes de ancorar no Jornal do Brasil.
Novidade capaz de revelar segredos como se os guardasse, e de desvendar mistérios como se os tivesse criado, enquanto fingia escrever apenas sobre futebol. Você não usava o jornal, o rádio, ou a televisão para abordar apenas um assunto. Quem sabia te ler ou te ouvir, percebia que você ensaiava vôos livres, ilimitados.
Uma vez, numa mesa-redonda de TV, enquanto um jogador estreante era elogiado por todos, você aproveitou a presença do diretor do clube e cobrou-lhe um salário justo para o gênio que despontava. Outra vez, em 1970, e isso não há quem não saiba, você deixou de ser técnico da Seleção Brasileira porque o Presidente da República quis te obrigar a realizar um vôo rasante, limitado.
Talvez ele não soubesse que você, comunista convicto, entendia de prisões e liberdades. Tanto, que saiu por aí, assoviando, à procura e ao reencontro dos companheiros. Te vi entre eles há poucos dias, comentando os jogos da Copa. Cansado, envelhecido. Não sabia que você não mais andava. Nem que tinha apenas um pulmão. Nem que afirmara ser essa sua última Copa. Uma vez mais, você sabia o que dizia.
João, brasileiramente, do seu jeito, te desejo uma eternidade verdejante. Que você escolha, entre estádios, praças, jardins e plantações, o lugar mais bonito para assoviar e reencontrar os companheiros"
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A autora é Vivina Viana, jornalista, nossa leitora, e a crônica foi publicada em 22/07/1990 na revista "Fim de Semana", do jornal "ESTADO DE MINAS", periódico para o qual ela colaborou semanalmente durante dez anos (1990-2000). Atendendo a pedido nosso, Vivina, gentilmente permitiu que a publicássemos neste humilde e despretensioso blog. Muito obrigado, Vivina. A honra foi somente nossa.
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17 Comments:
Eii amigo é com muita alegria no meu coração que venho oferecer o selo de aniversario de 2 anos do Lua em Poemas, quero com ele selar e fortificar mais uma vez nossa amizade..
Gosto muito de seus textos,vc nem imagina como fiquei feliz de ler sobre o nosso saudoso João Saldanha, gosto muito e acompanho de perto o nosso futebol, afinal sou brasileira rsrs
Um gde abraço procê...
Bjs
Que belo texto da Vivina, falando deste jornalista que foi fiel às suas convicções até o fim.
Muito bom post, Adelino.
Um abraço e uma ótima semana para você.
Lindo texto da Vivina.
Abraços
Adelino, lí o texto até o fim. Curioso para saber quem falava com tanta emoção do João Saldanha. Lá no finalzinho, a explicação. É um texto da Vivina. Bom, não podia ser diferente. Emocionante.
Parabéns à autora e a voce pelo post.
Fortes abraços
Adelino,
se eu te disser que "não tenho palavras", você acredita?
A crônica ficou mais bonita em seu post!
Pelos comentários, estou sentindo que, ainda que escrita há dezoito anos, ela ainda fala ao coração do leitor. O quê que eu posso querer mais?
Te agradeço pela postagem e pelo carinho.
Vivina.
Nancy, antes de tudo meus parabéns pelo segundo ano do Lua em Poemas, que visito muito, comento pouco, mas aprecio demais. Vou lá ver o selo. O Saldanha sempre foi uma figura quase folclórica. Lembro-me dele quase sempre brigando à beira do gramado (naquele tempo técnico não entrava). Ou na boca do túnel. defendendo seu Botafogo FR que tanto amava.
Beijos, Nancy, tudo de bom.
Maria Augusta, quando li a crônica da Vivina também me emocionei, e eu não poderia de forma alguma deixar de reproduzi-la, tal a sua beleza. Obtido o consentimento dela, não pensei duas vezes. Sorte minha...
Grande abraço, Maria Augusta, e ótima semana para você também.
Lindo mesmo, Peri. Eu gostaria de ter sido o autor... Como não fui, pelo menos contribuií para rememorá-lo.
Grande abraço, Peri.E ótima semana.
Obrigado, Valter. Pelo jeito vocês já conhecem o trabalho da Vivina, mas parece que ela não tem blog. Tem certeza que não tem?
Valter, uma pergunta que não quer calar: você não está nem com um pouquinho de vontade de voltar a blogar, não?
Um grande abraço, Valter, e boma semana.
Eu acredito sim, Vivina. Mas da minha parte não vejo motivo para você não ter palavras. Você não sabe - claro que sabe - como é bom sentir reações iguais à sua diante de um post feito com simplicidade, mas com muito respeito e carinho.
Sinto-me recompensado. Nada a agradecer.
Grande abraço.
Adelino,
João Saldanha era fera, tanto quanto a Vivina o é. Li a crônica com emoção, degustando as palavras. Quando vi quem tinha escrito não pude deixar de sorrir. O mesmo texto bem escrito de sempre. Minha querida amiga e madrinha literária escreve bem faz tempo.
Grande abraço
Adelino, claro que conhecemos o texto da Vivina. Ela foi uma das "madrinhas" do Capão, Outras histórias. De brinde ganhei a quarta capa escrita por ela, o que não é pouca coisa.
Amigo, para ser sincero não tenho a menor vontade de voltar ao blog. Tenho comigo que o perplexoinside já é coisa do passado. Logo logo vc estará falando dele aqui, que é um lugar apropriado para nostalgia.
Um forte abraço
Adelino, claro que conhecemos o texto da Vivina. Ela foi uma das "madrinhas" do Capão, Outras histórias. De brinde ganhei a quarta capa escrita por ela, o que não é pouca coisa.
Amigo, para ser sincero não tenho a menor vontade de voltar ao blog. Tenho comigo que o perplexoinside já é coisa do passado. Logo logo vc estará falando dele aqui, que é um lugar apropriado para nostalgia.
Um forte abraço
Então, Lord Broken, diante da modéstia da Vivina, eu pensava que ela fosse apenas uma promessa, mas já era uma grande realidade. Modéstia, aliás, própria das pessoas inteligentes. Muita sorte sua tê-la como madrinha literária.
Grande abraço, Lord.
Valter, eu li sim a quarta capa do seu livro, mas não liguei a autora à Vivina...
Um grande abraço.
Adelino,
esse pessoal é meio exagerado...
Escrevo há mais tempo, só isso. Se nasci antes, bem antes, como não?
Trabalhei com Ricardo Ramos, pai do Lord Caco, e ele é o amigo de quem mais sinto falta e saudade. Natural que eu tenha um carinho sem fim pelo filho, que conheci menino ainda, quando escrevi um livro sobre o Graciliano para a série Literatura Comentada, da Abril. Mil novecentos e setenta e seis, talvez.
Quanto ao Valter, conheci-o aqui, nos blogs, via Caco. Conhecimento recente, afeto profundo. Tive a maior alegria em fazer a contracapa do livro dele, tão bonito.
Tenho uns livros infantis, uns juvenis, uns contos para adultos em antologias, outros tantos na cabeça, à espera Deus sabe de quê.
Sou mineira do interior, moro em São Paulo. Curso de Letras Neolatinas, três filhos.
Nos últimos tempos, graças ao Lord Caco, tornei-me leitora de certos(!)blogs. E palpiteira. Não, não tenho um. Ler é melhor que escrever...
Beijo da
Vivina.
Vivina, você é muito modesta. Eu gostaria de escrever igual a você. Igual não, pelo menos parecido.
Eu também sou mineiro. Nasci no Triângulo, moro aqui há mais de 50 anos, tenho três filhos (dois meninos e uma menina), todos cariocas. Minha esposa também era carioca. Talvez daí essa minha "dupla naturalidade"...
Acho engraçado quando vejo as previsões de tempo assim:
"Tempo chuvoso no Norte de SP, Triângulo Mineiro e Sul de Goiás.
Instável em Minas, Rio de Janeiro e Espírito Santo..." Mudaram a Geografia Política?
Sob certo aspecto é bom mesmo que não tenha blog, pois seus comentários são ótimos, e valem por vários posts.
Lord e Valter são privilegiados...
Muito obrigado, Vivina, pela sua atenção e carinho.
Beijos
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